segunda-feira, 12 de setembro de 2011

TROVADORISMO


TROVADORISMO - PARTE I  -  PANORAMA HISTÓRICO


Na história da literatura portuguesa o Trovadorismo é a primeira escola literária. Esse movimento literário compreende o período que vai, aproximadamente, do século XII ao século XIV.
A partir da segunda metade do século XII, Portugal começava a afirmar-se como reino independente, embora ainda mantivesse laços econômicos, sociais e culturais com o restante da Península Ibérica. Desses laços surgiu, próximo à Galícia (região do norte do rio Douro), uma língua particular, de traços próprios, chamada galego-português. A produção literária dessa época foi feita nesta variação lingüística.
A cultura trovadoresca refletia bem o panorama histórico desse período: as Cruzadas, a luta contra os mouros, o feudalismo, o poder espiritual do clero.
O período histórico em que surgiu o Trovadorismo foi marcado por um sistema econômico e político chamado feudalismo, que consistia numa hierarquia rígida entre senhores: um deles, o suserano, fazia a concessão de uma terra (feudo) a outro indivíduo, o vassalo. O suserano, no regime feudal, prometia proteção ao vassalo como recompensa por certos serviços prestados.
Essa relação de dependência entre suserano e vassalo era chamada de vassalagem.
Assim, o senhor feudal ou suserano era quem detinha o poder, fazendo a concessão de uma porção de terra a um vassalo, encarregado de cultivá-la.
Além da nobreza (classe a que pertenciam os senhores feudais) e a classe dos vassalos ou servos, havia ainda uma outra classe social: o clero. Nessa época, o poder da Igreja era bastante forte, visto que o clero possuía grandes extensões de terra, além de dedicar-se também à política.
Os conventos eram verdadeiros centros difusores da cultura medieval, pois era neles que se escolhiam os textos filosóficos a serem divulgados, em função da moral cristã.
A religiosidade foi um aspecto marcante da cultura medieval portuguesa. A vida do povo lusitano estava voltada para os valores espirituais e a salvação da alma. Nessa época, eram freqüentes as procissões, as romarias, além das próprias Cruzadas ? expedições realizadas durante a Idade Média, que tinham como principal objetivo a libertação dos lugares santos, situados na Palestina e venerados pelos cristãos. Essa época foi caracterizada por uma visão teocêntrica (Deus como o centro do Universo). Até mesmo as artes tiveram como tema motivos religiosos. Tanto a pintura quanta a escultura procuravam retratar cenas da vida de santos ou episódios bíblicos.
Quanto à arquitetura, o estilo gótico é o que predominava, através da construção de catedrais enormes e imponentes, projetadas para o alto, à semelhança de mãos em prece tentando tocar o céu.
Na literatura, desenvolveu-se em Portugal um movimento poético chamado Trovadorismo. Os poemas produzidos nessa época eram feitos para serem cantados por poetas e músicas (trovadores, menestréis, jograis e segréis). Recebiam o nome de cantigas, porque eram acompanhados por instrumentos de cora e de sopro. Mais tarde, essas cantigas foram reunidas em Cancioneiros: o da Ajuda, o da Biblioteca Nacional e o da Vaticana.



                                                  TROVADOR
Poeta que compunha a letra e a música de canções; em geral era uma pessoa culta.
jogral: cantor e tangedor ambulante, em geral de origem plebeia.
menestrel: músico-poeta sedentário; vivia na casa de um fidalgo, enquanto o jogral andava de terra em terra.
segrel: trovador profissional, fidalgo desqualificado que ia de corte em corte, acompanhado de um jogral.

                                              A  POESIA  MEDIEVAL PORTUGUESA

A produção poética medieval portuguesa pode ser agrupada em dois gêneros:
_ gênero lírico: em que o amor é a temática predominante; são as cantigas de amor e as cantigas de amigo;
_ gênero satírico: em que o objetivo é criticar alguém, ridicularizando esta pessoa de forma sutil ou grosseira; a este gênero pertencem as cantigas de escárnio e as cantigas de maldizer.

Gênero Lírico

Dentro do gênero lírico, o texto que dá início à literatura portuguesa chama-se Canção da Ribeirinha, escrita possivelmente em 1189, por Paio Soares de Taveirós.
Segundo Dona Carolina Michaëlis de Vasconcelos, essa cantiga foi dedicada à ribeirinha (Maria Pais Ribeiro), favorita de D. Sancho I, segundo rei de Portugual.

Cantiga de Ribeirinha
No mundo non me sei parelha,
entre me for como me vai,
Cá já moiro por vós, e - ai!
Mia senhor branca e vermelha.
Queredes que vos retraya
Quando vos eu vi em saya!
Mau dia me levantei,
Que vos enton non vi fea!
E, mia senhor, desdaqueldi, ai!
Me foi a mi mui mal,
E vós, filha de don Paai
Moniz, e bem vos semelha
Dhaver eu por vós guarvaia,
Pois eu, mia senhor, dalfaia
Nunca de vós houve nem hei
Valia dua correa
.
Paio Soares de Taveirós
Vocabulário:
Nom me sei parelha: não conheço ninguém igual a mim.
Mentre: enquanto.
Ca: pois.
Branca e vermelha: a cor branca da pele, contrastando com o vermelho do rosto, rosada.
Retraya: descreva, pinte, retrate.
En saya: na intimidade; sem manto.
Que: pois.
Des: desde.
Semelha: parece.
D’haver eu por vós: que eu vos cubra.
Guarvaya: manto vermelho que geralmente é usado pela nobreza.
Alfaya: presente.
Valia d’ua correa: objeto de pequeno valor.

Há dois tipos de poemas pertencentes ao gênero lírico, no Trovadorismo:

  Cantiga de amor:

A cantiga de amor é de influência provençal (Provença ? região do sul da França). Esse tipo de cantiga mostra o amor cortês da época; o poeta fala em seu próprio nome, exprimindo seus sentimentos amorosos pela dama cortejada. É um amor de realização impossível, pois sua amada é casada ou pertence a uma classe social superior à sua. Por não ser correspondido, o homem sofre (coita d'amor), exterioriza suas queixas, humilha-se aos pés da amada, como um servo (vassalagem amorosa).
Sempre respeitoso, o eu-lírico masculino jamais revela o nome de sua amada, enfatizando sempre que ela é superior a ele. A mulher é chamada de mia senhor e o eu-lírico tece elogios à sua beleza, ao mesmo tempo em que sofre por saber que jamais poderá tocá-la. Influenciado pela moral cristã, o poeta se dispõe a um afastamento casto de sua amada, desejando-a, respeitosamente, a distância.

    Cantiga de Amigo
 
                                           
Originou-se na Península Ibérica. Nas cantigas de amigo, o trovador expressa os sentimentos que ele supõe que a amada lhe dedique. A principal característica das cantigas de amigo é o sentimento do eu-lírico feminino, embora elas sejam escritas por um homem.
A cantiga de amigo procura mostrar a mulher dialogando com sua mãe, com uma amiga ou com a natureza, sempre preocupada com seu amigo (namorado). Outras vezes, o próprio amigo é o destinatário do texto, como se a mulher desejasse fazer-lhe confidências de seu amor.
Mais populares, as cantigas de amigo não se ambientam em palácios, e sim em lugares mais simples, como o campo, as igrejas, etc. Mostram, muitas vezes, cenas do cotidiano, em que a moça vai lavar roupa, vai a uma romaria ou freqüenta uma festa.
As cantigas de amigo apresentam alguns aspectos que as diferenciam das cantigas de amor:
_ os temas são mais variados que nas cantigas de amor;
_ por serem cantigas populares, a linguagem é menos rica e mais musical;
_ destinam-se ao canto e à dança;
_ nelas são configurados os problemas sociais e políticos.
Além disso, quanto à forma, é freqüente o uso do refrão (repetição de versos) e do paralelismo (construção que se repete com pequenas alterações a cada estrofe). Quando não apresenta refrão, a cantiga é considerada melhor elaborada, recebendo o nome de cantiga de maestria ou maestria.



Ai flores, ai flores do verde ramo,
se sabedes novas do meu amado,
ai deus, e u é?

Se sabedes novas do meu amado,
aquele que mentiu do que me há jurado
ai deus, e u é?

D. Dinis
Cantigas satíricas
De origem popular, essas cantigas retratavam uma temática originária de assuntos proferidos nas ruas, praças e feiras. Tendo como suporte o mundo boêmio e marginal dos jograis, fidalgos, bailarinas, artistas da corte, aos quais se misturavam até mesmo reis e religiosos, tinham por finalidade retratar os usos e costumes da época por meio de uma crítica mordaz. Assim, havia duas categorias: a de escárnio e a de maldizer.
Apesar de a diferença entre ambas ser sutil, as cantigas de escárnio eram aquelas em que a crítica não era feita de forma direta. Rebuscadas de uma linguagem conotativa, não indicavam o nome da pessoa satirizada. Verifiquemos: 
Roi queimado morreu con amor
Em seus cantares por Sancta Maria
por ua dona que gran bem queria
e por se meter por mais trovador
porque lhela non quis [o] benfazer
fez-sel en seus cantares morrer
mas ressurgiu depois ao tercer dia!...
Pero Garcia Burgalês



                                             Os Cancioneiros
Se hoje temos acesso a textos do trovadorismo é graças à compilação feita em três grandes cancioneiros:
a) CANCIONEIRO da Ajuda: assim designado por conservar-se na Biblioteca do Palácio da Ajuda, em Lisboa, no qual são agrupadas 310 cantigas de amor.
b) Cancioneiro da Vaticana: encontrado em Roma, na biblioteca do Vaticano, datado dos fins do século XV. Contém 1205 cantigas de todos os tipos.
c) Cancioneiro da Biblioteca Nacional de Lisboa: o mais completo dos três, com 1647 poesias. Foi copiado na Itália, no século XVI; pertenceu a um humanista italiano, Ângelo Colocci, e, no século XIX, foi encontrado na biblioteca do Conde Brancutti. Por isso, às vezes, é também chamado de Cancioneiro Colocci-Brancutti.




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